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MENOTTI DEL PICCHIA |
Ao
analisar esse grupo literário Verdeamarelo, que teve como lideranças
Menotti Del Picchia, Cassiano Ricardo e Plínio Salgado, a professora
Mônica Pereira Veloso, em interessante artigo, levanta um fato
importante: estávamos no pós Primeira Guerra Mundial, a Europa
representava um passado que não deu certo, a América era um mundo
novo a ser valorizado. Segundo ela “Recorrendo às metáforas
organicistas, nossos intelectuais exprimem a ideia da velha e da nova
civilização: o Brasil é o organismo sadio e jovem, enquanto a
Europa é a nação decadente que deve fatalmente ceder lugar à
América triunfante”. Nesse espírito é que o grupo liderado
por Menotti vai se afastar dos lideres da Semana de Arte Moderna e
trilhar por um caminho de declarada oposição a eles.
Com a
derrocada do Velho Mundo “Alguns intelectuais interpretam o
contexto como uma confirmação da análise de Spengler que previa o
fim da cultura europeia e a aurora do novo mundo.” No entanto,
a situação do Brasil não era nada confortável, havia por aqui o
problema dos grupos fechados de imigrantes, um imenso território
desabitado, a concentração demográfica apenas no litoral, a
população do sertão e do interior da Amazônia viviam em completo
isolamento de tudo o que acontecia nos centros cosmopolitas. Isso por
vezes vai desembocar em conflitos armados como houvera acontecido em
canudos. Esse problema poderia levar a outro: a intervenção
internacional movida pela cobiça ao território brasileiro.
Mônica
cita oportunamente o discurso de Afonso Arinos que alertava “se
o Brasil tem um território, não tem ainda o que se pode chamar de
nação”. A palavra de ordem passa a ser essa: construir a
nação.
“Os fatores negativos atribuídos à nossa
civilização não o são, na realidade. Se aparecem assim é porque
as elites brasileiras se pensaram e pensaram o seu país de acordo
com a mentalidade européia”.
Era
preciso fortalecer o espírito patriótico do povo, necessário seria
então ter um grupo étnico que pudesse ser o representante do povo
brasileiro “Encontrar um tipo étnico específico capaz de
representar a nacionalidade torna-se o grande desafio enfrentado pela
elite intelectual.” O Brasil é um país formado pela mistura
de várias etnias eis ai um grande problema a ser resolvido.
Os
intelectuais brasileiros se vem numa posição de superioridade com
relação aos demais compatriotas e “Tomados deste sentimento de
orgulho e resignação, os intelectuais brasileiros se auto-elegem
executores de uma missão: encontrar a identidade nacional, rompendo
com um passado de dependência cultural”. Nesse espírito
surgem os grupos da poesia Verdeamarelo, de Menotti Del Picchia e da
poesia Pau-Brasil, de Oswald de Andrade.
Todavia,
apesar desse ponto que os filiam a um objetivo comum, Péricles
Eugênio da Silva Ramos, no capítulo 49 da obra dirigida por Afrânio
Coutinho,(COUTINHO – 1997) afirma que o grupo do verdeamarelismo se
opõe ao Pau-Brasil “naquilo que se prendia às raízes
francesas – contra a importação dos ismos em geral”. Já a
professora Mônica, em um artigo publicado com o título
“BRASILEIRISMO VERDE-AMARELO” aponta o grupo Verdeamarelo como um
grupo representante da direita paulista e que as ideias desse grupo
vão servir de base à política integralista. Ela aponta também
três coisas que servem de base para o ideário desse grupo:
“nacionalismo-território-heroísmo”.
Outro trabalho interessantíssimo sobre esse tema é a dissertação de mestrado da historiadora Helaine Nolasco Queiroz. Segundo ela:
“O Verdeamarelo considerava a arte um dos locais onde mais facilmente a dependência cultural brasileira se evidenciava. Desde o período colonial até o século XIX, os moldes estéticos estrangeiros, especialmente os europeus, foram utilizados no Brasil, com destaque nas artes plásticas e na literatura, causando uma dependência da matriz europeia digna de censura”.
Nesse
período a obra literária passa a ser analisada pela forma como
aborda o território e a sociedade brasileira. Quanto maiores forem
as informações trazidas pela obra sobre esses temas, maior será o
seu valor literário. O grande problema do grupo Verdeamarelo é que
seus integrantes supervalorizavam São Paulo em detrimento dos demais
centros brasileiros, principalmente o Rio de Janeiro. Segundo eles, o
paulista é que representa o verdadeiro brasileiro,com sua inclinação
natural ao trabalho, iniciada pelos bandeirantes é que foi possível
expandir o território nacional, enquanto que o Rio de Janeiro ficou
largado ao ócio, contemplando o mar com suas belas praias.
“A visão ufanista de São Paulo traz um aspecto interessante: a
desqualificação empreendida em relação ao Rio de Janeiro. A
promiscuidade de suas praias, o aspecto anárquico de sua economia, a
futilidade dos hábitos cariocas e a violência e amoralidade do
carnaval são objeto de inúmeras crônicas e charges publicadas no
Correio Paulistano”.(Mônica)
Houve uma bifurcação de entendimento sobre a brasilidade entre o grupo liderado por Menotti e os Modernistas. Sobre isso Mônica tece o seguinte comentário:
“O
que é o Brasil? Um país fragmentado pelas diferenças ou um
conjunto homogêneo? E o regionalismo? Seria um sinal do nosso
atraso, um obstáculo à atualização da cultura brasileira ou, pelo
contrário, o depositário da nossa verdadeira identidade? São essas
as questões que aquecem o debate intelectual modernista, criando
cisões, confusões e alianças. Se, de certa forma, a
idéia do Brasil como conjunto cultural que se impõe
pela sua originalidade é unânime, a constatação do
fato não dilui as divergências.”
De um
lado estava Mario de Andrade com a visão de que o brasileiro é um
“Macunaíma- herói sem nenhum escrúpulo”. Mostrando através de
sua teoria de “desgeografização” do Brasil, uma forma de
entender o país que não se baseasse apenas no fator espacial, como
queria os verdeamarelos, no entanto levando em conta a questão
temporal e histórica. Do outro, formou-se o grupo Verdeamarelo que
supervaloriza a questão regional, apresentando como modelo a ser
seguido a região do Estado de São Paulo.
“Para
os verde-amarelos, São Paulo se apresenta como o cerne da
nacionalidade brasileira, justamente pela sua configuração
geográfica. A originalidade da geografia paulista investiu a região
de um destino especial: ser o guia da nacionalidade brasileira. O
argumento se desenvolve da seguinte forma: diferentemente das demais
regiões do país, em São Paulo os rios correm em direção ao
interior. Este fato teria obrigado os paulistas a caminharem em
direção ao sertão, abandonando o litoral. Por uma questão de
fatalidade do meio ambiente, eles se tornaram, então, bandeirantes e
desbravadores. Ao se internarem nos sertões, os bandeirantes teriam
abdicado dos falsos valores do litoral-alienígena para encontrar os
filões do Brasil-autêntico, que é o rural”.
E
mais:
“Assim,
a valorização do regionalismo coloca-se como imprescindível porque
possibilita "delimitar fronteiras, ambiente e língua local".
E mais: só o regionalismo é capaz de dar sentido real no tempo e no
espaço, já que o ritmo da terra é local. Assim, o brasileiro não
deve acompanhar o ritmo da vida universal,pois este é abstrato,
genérico e exterior. A alma nacional tem um ritmo próprio que deve
ser respeitado custe o que custar. É este senso extremado do
localismo que marca a doutrina verde-amarela, diferenciando-a do
ideário modernista.”
Os Verdeamarelos veem no período colonial do século XVI o momento
áureo da nossa história, pois foi quando houve a integração
pacífica do elemento colonizado com o colonizador. Esse momento
passa a ser visto por eles como atemporal, presente, que deve ser
revivido, menosprezando a evolução temporal e histórica. Essas
ideias estão presentes no manifesto Nhengaçu.
Se Mario de Andrade criou Macunaíma, o anti-heroi que representa o
povo brasileiro, malandro, preguiçoso sem nenhum escrúpulos, o
verdeamarelista Cassiano Ricardo criou Martim Cererê, que encarna o
clássico bandeirante paulista, bravo, honrado e disposto ao
trabalho.
Para Mônica:
“O
personagem Macunaíma não corporifica apenas qualidades consideradas
positivas, mas inclui todas as fraquezas e vacilos do ser nacional
que, dilacerado entre duas culturas, busca a sua estratégia de
sobrevivência. Este herói, ou este anti-herói, é o próprio
Brasil: ambíguo, conflitante, em constante procura de identidade.”
Com
relação ao Martim Cererê, diz: “ [..] é aquele que realiza a
"epopéia dos trópicos". Ele é pleno de atributos por sua
capacidade de enfrentar dificuldades, seu espírito aguerrido, seu
altruísmo ímpar”. Esse era o paulista na sua essência,
segundo os verdeamarelos.
Assim, o
grupo Formado por Menotti Del Picchia, Cassiano Ricardo, Plínio
Salgado e Raul Bopp, que recebeu o nome Academia Verdeamarelo, foi
uma tentativa quase fascista de tentar impor a cultura paulista como
a única representativa da cultura brasileira. Esse foi um grupo,
acima de tudo, representante da elite paulista. Esse grupo foi criado
por Menotti em 25 de julho de 1926, dois anos depois da realização
da Semana de Arte Moderna, e durou até o final de 1927, quando seus
integrantes declaram encerrada a missão do grupo. Os mesmos
integrantes desse grupo foram quem formaram o Grupo da Anta, que logo
depois e dissolvido, indo cada um tomar o seu rumo na literatura e na
política brasileira na década de 1930. Essa será a segunda fase
do modernismo, 1930 a 1945, foi a chamada “fase de extensão” ou
pós-modernismo”.
(Aurismar Lopes Queiroz, pós-graduado em Estudos Linguisticos e Analises Literária)